quinta-feira, 21 de junho de 2012

estado ausente, indivíduos frágeis


No auge de minha vida acadêmica, encontro-me, arraigado a esta ilha como nunca antes. Não seria um auge propriamente dito, mais enfim, o momento tão esperado, o último ano dos que já foram muitos. Posso dizer que é um período produtivo, e muito, mais pouco se deve ao entorno acadêmico, que a meu ver, castiga tanto seus alunos quanto a rotina de um humilde trabalhador que se desloca diariamente do longínquo submundo periférico ao centro de uma grande metrópole, ganhando muito pouco e com ainda menos perspectivas de vida melhor.

Esta população pobre, seja de recursos como de possibilidades, tanto se desgasta em sua rotina de sobrevivência que ao fim de cada jornada, não alcança maneiras de lutar por seus direitos, de refletir sobre sua situação, de organizar-se e tomar um posicionamento que, em uma sociedade mais justa, permitiria talvez, uma mudança no caminho das coisas. Assim como esta machacada camada da nossa sociedade, os alunos como eu, embora em escalas e por motivos distintos, também sofrem. É importante deixar claro que são realidade bastante distintas, aqueles trabalhadores representam a maioria de uma sociedade desigual e injusta, nós, alunos, somos minoria, extremamente beneficiada.

A contraposição foi colocada por um motivo simples, que a energia despendida para realizar as atividades cotidianas que cabe a cada atividade, seja do trabalhador ou do aluno, é muito maior daquela que o próprio indivíduo dispõe. Com isso, não há condições mínimas para que estas pessoas desenvolvam capacidade crítica ou atuação política. Acabam sufocados por suas próprias atividades e, quando muito, por outras de caráter mais superficial que são a única fuga do submundo dos perdedores em que habitam sem perspectivas próximas de ascensão social. Parece-me que estes sujeitos se apresentam como uma espécie de “servos da modernidade”.

Isto não pretende ser uma justificativa da minha pequena longa carreira de aluno. É somente um comento sobre aquele “auge” que citei inicialmente. Pois, somente liberto das intensas e desestimulantes atividades acadêmicas é que o aluno pode desenvolver-se politica, crítica e artisticamente. Talvez sejam apenas fases, etapas que servem de peldanhos para alcançar algo mais a cada passo. Ou, sejam apenas pobres justificativas de algo injustificável, mais ainda assim, necessário.

Pois, paradoxalmente, mais livre e consciente, encontro-me radicalmente fixo a este território. Não que isso seja um dado negativo, muito pelo contrario, devo muito de tudo e de cada pequena coisa a esta cidade e a vida que levo aqui. Entretanto, infelizmente, minhas viagens longas e duradouras se extinguiram, e minhas fugas sazonais acabaram minguando. Mais é justamente num destes esparsos deslocamentos que tratei de compor este conto.

Percebi em uma pequena cidade, transformações evidentes que atropelam o quase imutável e tranquilo ritmo de vida de seus habitantes. Aqueles indivíduos, habitualmente sonolentos e despretensiosos, pouco percebem o ritmo frenético com que seu espaço urbano se transforma. Pequenas e médias cidades se modificam em um ritmo desconhecido, influenciado fortemente pela atual situação econômica privilegiada com que nosso país vive.

Estamos passando por uma espécie de “entusiasmo construtivo” que é fortalecido por financiamentos habitacionais abundantes via Programa Minha Casa Minha Vida. As cidades transformam-se em verdadeiros canteiros de obras, entretanto, a maioria destas obras, principalmente nos centros urbanos, parece privilegiar uma pequena parcela da população, enquanto que o chamado déficit habitacional paira sobre outra parcela, aquela de baixa renda. Mais, como bem foi colocado, estes investimentos habitacionais fazem parte de uma estratégia econômica, muito distante de uma política social.

Também faz parte desta política “anti-crise”, a redução de impostos sobre veículos novos. Vemos então um aumento significativo da frota de veículos e uma aparente estabilidade econômica. Diferentemente disso, as nossas cidades não apresentam a mesma tranquilidade, na verdade, percebe-se um real deterioro e degradação de seu espaço físico. Ora, pois, milhares de novos edifícios e obras públicas não deveriam qualificar nosso país? A primeira vista essa indagação poderia ser uma afirmação veemente. Entretanto não é o que acontece na prática.

É triste que tantos recursos sejam assim mal aplicados, para não dizer desperdiçados. Podemos até considerar uma espécie de desperdício, pois, quase sempre o barato sai caro. Se voltarmos a produzir habitação para baixa renda massivamente em áreas periféricas e, de uma qualidade completamente questionável, qual será a permanência destas arquiteturas? Destruiremos amanhã estas novas cidades que estamos construindo hoje? Tudo aponta para um fatídico “sim”.

E o que faremos com tantos carros? Com tantas novas pistas asfaltadas a cada dia? Enquanto os carros se proliferam como praga, as vias urbanas, a infraestrutura viária e os transportes públicos pouco se modificam. Assim, valorizando o automóvel e desvalorizando a arquitetura, poderíamos prever além de cidades cada vez mais congestionadas e de aparência questionável, pessoas crentes que o automóvel é o verdadeiro símbolo de ascensão social. Talvez futuramente as pessoas passem a morar em seus veículos e nos concentraremos apenas, em projetar garagens. 

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