sábado, 24 de dezembro de 2011

beltrão tem mais livrarias que pato branco!

Por Vinicius Libardoni

Existem acontecimentos estranhos.  Porém, estes sucedem somente com pessoas neuróticas. Completamente neuróticas. Não que me considere assim, uma pessoa perturbada, pelo menos, não muito. De fato, estes indivíduos, atingem tal grau de controle sobre as coisas que, acabam se descontrolando redondamente.

Chegar à rodoviária, na véspera de uma viagem, sem ter um documento em mãos não me surpreende. O mais interessante é que havia tempo suficiente para tomar três ônibus que me levavam até em casa, pegar meus documentos, e voltar para meu destino a tempo. Bem, com uma pequena folga que ainda me permitiu comprar um delicioso pão de queijo antes do embarque. É isso que eu chamo de “neurose crónica do tempo”.

Falando em tempo, passei horas sentado desconfortavelmente naquela poltrona. Não fosse o bastante, o maldito ônibus tinha que quebrar. Isso porque eu podia escolher outro horário, eram dez ônibus para o mesmo destino. E o destino do ônibus que levava o neurótico era quebrar no meio da estrada. Paciência. Não havia sido nem a primeira e, com toda certeza, não será a ultima vez que o destino, ou melhor, o ônibus apronta uma destas comigo.

Apesar da aparente tranquilidade, a turbulência da viagem se encarregou de potencializar as sensações desagradáveis que me acompanhavam ao longo do caminho. Assim, cheguei ao meu destino depois de dezesseis horas de aventuras. Isso porque foram apenas setecentos quilômetros, o que me pareceria uma média de muitos poucos quilômetros por cada hora.

Mais todo esse blá-blá-blá não é o que interessa. Na verdade isso ai não tem interesse algum.

Esta proeza toda foi, simplesmente, para visitar minha família em uma pequena cidade do interior. É ai que eu me refiro. A esta cidade interiorana que me fez refletir sobre algo interessante, sobre como o ambiente pode moldar, em parte ou completamente, os seres humanos que nele habitam.

Caminhar por estas ruas é deparar-se com uma quantidade enorme de algumas atividades, enquanto outras parecem não existir. Poderia aqui ficar numerando uma quantidade inacreditável de farmácias, lojas de roupa, açougues, garagens, enfim, que refletem diretamente na cultura dessa gente. Porém, o mais intrigante é que não existe uma livraria. Pode-se dizer, há um lugar que vende uma meia dúzia de best-sellers, mais nada que se pareça com uma livraria.

Alguém poderia dizer que hoje em dia não se compram mais livros nestes locais, que a internet pode fornecer todo o tipo de informação e que a criação do e-book vai acabar com esta cultura ultrapassada de comprar livros e de acumular um monte de papéis. Mentira. Calúnia.

A internet tem se mostrado um grande aliado à superficialidade do ser humano. Embora exista uma disponibilidade enorme de informação ao alcance de todos, há uma incrível preferência por futilidade em relação à utilidade.

Se no passado existiam cinemas e livrarias nesta cidade, porque estas atividades caíram em desuso? Será a internet e o excesso de informação a causa desta morte prematura das atividades de formação cultural nas pequenas cidades? O que poderíamos fazer para reverter esta situação?

Como dizem por ai, “sempre teremos mais perguntas que respostas”, e são as perguntas que nos levam adiante, são as indagações que nos induzem a evoluir psicologicamente.

Será que este ambiente empobrecido está moldando os indivíduos que nele habitam, ou será que a superficialidade dos indivíduos é que está produzindo um ambiente tão pobre? Um alienado poderia facilmente confundir as situações, porém, foram os indivíduos que criaram esta realidade, que moldaram o espaço, que criaram e se utilizaram de suas atividades. Entretanto, também foi os indivíduos, não individualmente e sim como coletividade que, desenvolveram esta cultura da superficialidade, banalidade e futilidade. Estas características, intrínsecas a nossa sociedade hoje, se apropriaram do ambiente e são fruto direto das atividades, individuais e coletivas, que foram moldando as relações sociais e, indiretamente, os usos e as atividades que compõe o espaço da cidade.

Parabéns a todos nós (eu também me incluo neste seleto grupo), estamos conseguindo desenvolver um ambiente inóspito, frequentamos sempre os mesmos lugares, encontramos sempre as mesmas pessoas (isto não seria um problema se elas não tivessem sempre as mesmas ideias baratas construídas no último capítulo da novela das nove) e moldando um espaço tão pouco convincente quanto as nossas próprias convicções.

Já não dá pra acreditar em um futuro, se é que ele possa ainda existir. Mais no fim, o mundo acaba ano que vem mesmo. Deixemos de tanto papo furado e vamos ao que interessa. Ao contrário destas tantas tonterías, se Beltrão tem mais livrarias que Pato Branco, isso pode ser um motivo pra tentar reverter a situação. Talvez assim, com essa ideia de competitividade sempre presente na sociedade hoje, alguém pense em alguma coisa, se é que podemos ainda pensar.


segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Scarface

Por Vinicius Libardoni

Era outono do ano de 1930. Figuras ilustres se amontoavam as portas do Teatro Paramount. O frio estava presente na elegância de cada indivíduo.  La dentro, o clima ameno e a tranquilidade das vozes permeavam os murmúrios que preenchiam aquele foyer. Nada, naquele instante, poderia anunciar a cena que em breve sucederia, marcando o início deste relato.

O jovem escritor Armitage Trail, sentado comodamente em uma poltrona azul aveludada, falecia repentinamente de um ataque cardíaco. Tinha apenas vinte e oito outonos presenciados, dos quais, a maioria passou despercebida. As folhas amarelas, que do lado de fora na 43th Street caiam, pareciam acompanhar o carro fúnebre negro que, horas depois, passava pela Times Square.

Antes deste terrível acidente, se assim podemos chama-lo, uma novela intitulada Scarface havia sido composta pela mente aguçada daquele defunto do Teatro Paramount.

Neste momento mudamos radicalmente o nosso foco do carro fúnebre que atravessava New York no outono de 1930 para outro indivíduo, que a esta altura, estava tão vivo quanto eu e você.

Ben Hecht tinha então 38 anos. Além de novelista, como nosso falecido amigo, foi roteirista, diretor, produtor e foi até chamado de “Shakespeare de Hollywood”. Entretanto, nosso interesse não está nos méritos de Hecht, e sim em sua criatividade.

Ben adaptou a novela de Armitage Trail para ao roteiro do que viria a ser um dos melhores filmes gângsteres de todos os tempos. Scarface foi o primeiro grande filme dirigido por Howard Hawks, em 1932. Um clássico.
Scarface deveria ser o próximo filme para aqueles que tanto admiram este gênero. Francis Ford Copolla, Sergio Leone, Martin Scorsese ou até Brian De Palma não são os únicos que fizeram bons filmes. Não pensem que prefiro um ao outro. Não é questão de preferência e sim de referência.

Tenho certeza que Hawks foi, e ainda é uma grande referência para todo bom diretor. Scarface é um filme. Um filme dirigido com maestria, um filme que contém todas as características de um bom filme do gênero. Um filme de 1932 que deveria ser visto antes que o próximo nomeado a Cannes. Aliás, é isso que mais me enche a paciência, esse desejo incessante por novidade, sendo que tal novidade não contém nada de novo.

Esse é um dos grandes problemas que enfrentamos hoje, uma mania absurda por novidade quando o que mais importa são as referências, e como elas são interpretadas. Qual o prazer maior que ver um bom novo filme e compreender pessoalmente quais são as referências implícitas em cada plano sequencia?

Não pretendo aqui ficar me alterando quando o foco é apenas dar uma sugestão a quem procura. O filme de Howard Hawks fala por si só, não cabem aqui explicações, pois as mesmas são desnecessárias.

Falando em referências, modismos e bons filmes, volto a um diretor anteriormente citado. Brian De Palma, nascido em 1940, tinha apenas oito anos quando Scarface foi a atração principal nas salas de cinema americano. O motivo que o levou a reinterpretar a Obra de Hawks eu não sei. Somente me comove, com alegria, a referência ao maestro e a Ben Hecht que está estampada explicitamente no final das quase três horas do filme Scarface de 1983.

Reinterpretar uma obra deste calibre é, de fato, uma tarefa muito delicada. Porém, me dedico a escrever bons comentários e deixo as críticas para quem realmente entende do assunto. Embora a trama seja distinta, existe uma sutileza de detalhes que enriquecem a obra anterior. Acredito que é neste ponto que reside a verdadeira contribuição, pois o retrato colabora com a compreensão do retratado.

Os personagens constroem outras personalidades, pois, os tempos são outros, as cobiças são diversas o contexto é divergente do anterior. Qualquer tentativa de recriar um personagem seria uma caricatura superficial, porém, Brian é inteligente, ele recria a essência do roteiro por caminhos bastante diversos. Até chegamos a acreditar que o futuro de alguns será diferente porque a própria expectativa do expectador é diferente. Mais a referência estava completa, não existe a necessidade de se alterar a finalidade, somente o caminho.

O cinema de Hawks é puro. Nem tudo é dito ou explicitado. A essência de seu cinema permite a cada individuo sentir-se parte da trama, em desejar alterar a ordem das coisas. Brian De Palma altera a ordem dos fatos, joga com os acontecimentos e consequentemente com as expectativas e esperanças de quem assiste ao filme.

Brian é mais evidente, ele deveria ser. De nada adianta utilizar-se da mesma linha de tempo, isso tornaria o filme um tédio. Ele dá espaço a novas formulações enquanto entrega rapidamente aquilo que foi dado lentamente no Scarface anterior. Todos os fatos tem uma intensidade muito maior no filme de 1983, às vezes até um quanto exagerada. É típico de o cinema novo cometer exageros, porém, nada que estrague todo o brilho da história.

A evidencia dos fatos no cinema de Brian De Palma se contrapõe a sutileza dos acontecimentos no cinema de Howard Hawks. Antigamente as pessoas iam várias vezes ao cinema assistir ao mesmo filme, e ele continuava apresentando novos detalhes, novas mensagens, causando surpresa. A pesar de tudo, só me resta aplaudir as boas releituras de filmes clássicos como este, e aguardar ansiosamente por um título que possa se repetir na minha lista de filmes preferidos. “Porque eu sempre digo a verdade, até mesmo quando minto”.




Scarface. Direção: Howard Hawks. Produção: Howard Hughes. Roteiro: Ben Hecht. Baseado na Novela Scarface de Armitage Trail. Estúdio: The Caddo Company. Distribuição: United Artists. Estados Unidos 09 de Abril de 1932. 93 min.
Scarface. Direção: Brian De Palma. Produção: Martin Bregman. Escritor: Oliver Stone. Distribuição: Universal Pictures. Estados Unidos 09 de Dezembro de 1983. 170 min.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

redes sociais e a mediocridade "tupiniquim"

Descobri, numa tarde de domingo, para que servem as redes sociais. Imbecil comum, ainda não havia comprovado a teoria que dizem por ai. Por horas esperei a conexão que não se encontrava em lugar nenhum, e ela somente voltou quando quase tive um ataque de abstinência. Não sei quando é que vão tratar este tema, de acesso à internet, como uma necessidade fisiológica, como ela realmente tem comprovado ser. O que? Não concorda? A falta de internet é uma das poucas coisas que faz o ser humano tomar iniciativas para resolver um assunto imediatamente. Livrar-se do vício da internet é um processo longo, e, acredito eu, será semi-impossível nos próximos anos. Esta podridão se agrava com o uso das redes sociais, pergunto-me: quanto tempo você consegue usar a internet sem verificar sua rede social? Inacreditavelmente, é uma coisa que não esquecemos nunca! Nem falar daqueles que ficam conectados o tempo todo (no trabalho ou no celular), e é só mudar de aba no navegador. Concorde comigo ou não, isso é um vício.

Voltando a minha descoberta, que não é de a internet se configurar como uma necessidade fisiológica, e sim, em como a única coisa que realmente nos interessa nas redes sociais, é aquilo que não é de nosso interesse. Ai está o verdadeiro paradoxo da rede social.

Depois de aguardar por horas para poder acessar minha conta, e enfim, depois de longa espera, ter conseguido acessar somente a partir do celular, aquele aparelho inútil que somente me permite ver as atualizações que dizem respeito a mim mesmo. Fiquei irado, porque não havia nada que me dizia respeito, e, logicamente, o que mais importa, é o que realmente não me diz respeito. Por isso que perdemos tanto tempo nessas inutilidades de redes, porque sempre há informações alheias, milhares, infinitas de informações e, quanto mais tempo você passa “se atualizando”, mais deseja saber sobre aquilo que cada vez mais, acredite ou não, não tem a mínima importância pra você.

Entretanto, por mais que isso pareça ser uma tendência universal, é aqui, em nosso país, que esse apodrecimento é mais intenso. É incrível como a superficialidade de nossos conterrâneos tem a enorme capacidade de potencializar o lado ruim das coisas. Lembro-me de como a “brasilidade” afundou o queridíssimo Orkut e, não contente, vem arruinando o pouco que prestava do Facebook. Mais como nem tudo está perdido, descobri recentemente, através de uma pessoa muito mais afiada que eu, a ferramenta “cancelar assinatura”. E assim, minha nova diversão agora é ir cancelando a assinatura de cada idiota que aparece ali na minha telinha. É incrível como quase um 90% dos meus conterrâneos já foram cancelados e somente um 10% dos estrangeiros deixaram esta lista. É, me aborreço cada dia mais com a futilidade dos meus colegas. É, acredito que estou me tornando um velho ranzinza. 

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

calem-se os leigos

Por Vinicius Libardoni

A cidade é, em primeira instância, algo muito complexo. Está composta por edifícios, pessoas, espaços, enfim, milhares de coisas que existem por si só e se relacionam simultaneamente com todas as outras. Quando se visita um lugar, cada ser humano está passando por uma experiência única, as cidades não parecem estranhas, pelo menos, não completamente. A maioria se parece com alguma que você já conhece, ou seja, ao observar cada edifício, cada placa, cada signo ou informação, buscamos compreende-las, e o que é compreender senão o ato de abstrair ideia ou noção de alguma coisa de acordo com sua experiência prévia incorporada através dos anos. Mais sinteticamente, você poderá localizar/identificar um monumento, uma praça, as ruas e avenidas, os bares, as estações, enfim, tudo ou quase tudo. Se aproximarmos a escala, muitas coisas podem ser deduzidas (pelo menos com um pouco de esforço mental), ou seja, definir áreas centrais, comerciais, residenciais, ou onde habitam as pessoas com maior poder aquisitivo e entender, partindo para uma análise, o porquê de tudo isso. Pode-se até prever quais áreas você não seria bem vindo, ou onde você estaria deslocado de sua situação de conforto por não fazer parte de uma coletividade presente. Enfim, sob os olhos treinados de uma pessoa pouco atenta e minimamente alienada, é possível extrair muitas informações sobre determinados espaços, lugares, cidades. 

Em uma segunda dimensão, não menos importante, poderíamos afirmar que a cidade se faz de pessoas, ou seja, é impossível que uma cidade seja cidade se aquelas pessoas que a constroem e habitam estiverem ausentes, não teria sentido algum. Desta maneira, a cidade é feita pelas e para as pessoas que ali se encontram. A cidade é ainda, uma definição geográfica de espaço, pois, ao definir um espaço cria-se um limite físico. A cidade é algo definido no espaço, porém, não existe um paradigma evidente sobre todas as outras coisas presentes nas cidades. 

Porque toda esta conversa sem sentido que mais parece uma novela que procura hipnotizar mentes frágeis e superficiais? Na verdade não está claro nem para este medíocre ser pensante que vos fala. Entretanto, é escrevendo que organizo meus pensamentos, então, tratarei de seguir adiante. Já que, o que interessa aqui é o processo de chegar a algum lugar e não exatamente aonde chegar. 
A cidade, bem, falávamos de cidades. Habitei em algumas cidades por um bom tempo e passei por centenas de cidades outras. Procuro minha própria identidade a partir da identidade de cada lugar, como se fosse um devaneio de autoconhecimento. Assim (falando de lugar, mesmo que esta discussão não faça mais, tanto sentido, pra não dizer sentido algum), nos identificamos com muitos lugares, ou seja, quando algum espaço nos agrada, significa que aquilo que sentimos encontra uma referencia com nós mesmos como indivíduo. Logicamente, esta viagem que fazemos inconscientemente em nosso conhecimento prévio, funciona em todas as instancias da vida. O grande problema reside em nossas próprias referências, ou melhor, quais são as referências que oferecem nossos meios de informação. Na arquitetura, tudo tem a ver com aquilo que escolhemos pra tomar emprestado, pois então, as velhas referências. Como se diz por ai, “ignorância não é contagiosa, se cura em uma biblioteca”. Infelizmente, minha experiência comprova, irrefutavelmente, que a incapacidade de levantar a bunda do sofá em busca de conhecimento, isso sim, é contagioso, e mais, aliena e leva a morte (pessoalmente, não vejo muita diferença entre um ser humano incapaz de usar 20% de sua capacidade mental e uma ameba, ou um ser vegetativo). Ninguém tem culpa de ser ignorante e, queira ou não, somos todos ignorantes em alguma dimensão. Ignorante, por não conhecer algo ou alguma coisa, ignora a existência das mesmas. Já o burro, é aquele que acha agradável ser um ignorante em todas as instancias e se orgulha deste lamentável fato. Mais isso não é conversa para burros.

Quando se é ignorante em determinado assunto, procuramos naturalmente alguém que possa suprir esta nossa, por assim chamar, deficiência. Por exemplo, quando se está doente o que se faz? Procura-se um médico! Por quê? Porque você é um ignorante em medicina e não pode se curar sozinho, pelo menos ainda não apreendemos esta faceta da medicina alternativa. Logicamente, muitas vezes você suspeita de seu problema e acaba por medicar-se sozinho, o que não é do todo errado, pois se cada pessoa com dor de cabeça procurasse um médico, isso seria um caos completo. Este seu conhecimento prévio ajuda muito ao médico, pois você precisa informar lhe os seus sintomas prévios corretamente, se não me engano, isso faz parte da anamnese ou coisa do estilo. Agora pergunto: porque na maioria dos casos, as pessoas não questionam a atitude de um bom médico? Pois sua saúde é o maior bem que você possui! Fácil assim!

Agora, enfim, passemos para a arquitetura. O que você faz quando planeja ter um lugar para morar. (Primeiro vamos excluir a hipótese de procurar uma imobiliária ou um corretor de imóveis, e em segunda instancia, e mais complicada, vamos excluir a hipótese de você procurar um engenheiro civil para projetar a sua casa, não entrarei em detalhes, pois, a minha incapacidade técnica me impede ou me faltariam argumentos). Enfim, vamos supor que você procure um arquiteto. Por quê? Pois ele é a pessoa especializada ou ao menos, indicada para este assunto. Logicamente você tem uma série de expectativas, experiências e referencias prévias sobre sua nova morada. Você sabe identificar um lugar aconchegante, um lugar opressivo, um lugar tranquilo, enfim, tudo que se refere a seus sentimentos em relação ao espaço. Muito bem, isso já é um grande passo. Vamos chegando mais perto do ponto mais importante. Você também possui milhares de referencias em relação ao que agrada você esteticamente, correto? Maravilhoso. Agora me pergunto, você entende de arquitetura? Na maioria das vezes não, não completamente. Você pode ser artista plástico, estilista, músico, enfim, uma série de coisas que se relacionam diretamente com a estética, tectônica, materialidade arte ou afins. Porém há um fato, você não compreende arquitetura na sua complexidade, além de que a arquitetura não é somente, e muito distante disso, um ofício estético. Ou seja, você argumentaria com seu médico para ele prescrever AAS infantil ao invés de lexotam somente porque você “gosta mais”? O que te dá o direito de argumentar com seu arquiteto, que você prefere Rococó na sua fachada porque você “gosta mais”? Bom, iniciamos um longo debate que está por vir. Deixamos de comparações com outras áreas e nos concentremos na arquitetura.

A sua casa é sua certo? Corretíssimo. Ou seja, ela deve estar de acordo com suas expectativas e seus sentimentos. Também é correto. Agora, também é tão certo como isso que a sua casa pertence a um lugar, a uma cidade, e principalmente, a um determinado tempo. O tempo de hoje. O que isso significa? Isso significa que um edifício tem identidade e você precisa se identificar com ele, e essa identificação deve ser perfeita quando se trata de Sua casa. Porem, devemos ir a fundo à essência e escapar de superficialidades. Isso já é uma tarefa difícil. Se um edifício tem identidade, e ela deve estar de acordo com o lugar e com o tempo, pergunto: é certo desejar morar em um templo grego? É certo! Desde que você encontre um templo grego na Grécia que esteja com uma placa de “aluga-se para fins residenciais”! É tudo uma questão de coerência temporal, tectônica e contextual. Como nos disse Derrida, que a arquitetura não é uma questão de espaço, é mais antiga que ele e, portanto, uma espacialização do tempo. 

Não entrarei em méritos da arquitetura “pós-moderna”, mais é vergonhoso que em pleno século XXI continuemos a reproduzir, mal e porcamente, fragmentos de arquiteturas históricas. Ainda fosse uma proposição fractal ou uma nova versão do ecletismo, porém, infelizmente, são apenas paródias, ou comédias pictóricas daquelas que se toma como referência. Se fosse possível, aquelas ruínas gregas e romanas estariam suplicando a autodestruição por haver sido tão mal interpretadas mais de dois mil anos depois. Aliás, desta maneira, parece que a arquitetura mal evoluiu nestes dois últimos milênios. Isso porque devemos ver a realidade a partir de tudo que se produz atualmente e não através de uns pouco e excepcionais profissionais. Lastimável situação.

Logo, não devemos estar preocupados em criar novas e espetaculares arquiteturas. Não há muito que se inventar por ai. Há, isso sim, uma série de boas referências, exemplos e possibilidades, os quais, podemos tomar como referência e a partir dos quais, podemos compor uma arquitetura adequada, coerente e correta. Apropriar-se da arquitetura, mais nunca reproduzi-la infielmente e muito menos, partes desconexas da mesma. Não se trata de criação e criatividade, se trata de preocupação com aquilo que é bom para nós, para os outros, para a arquitetura e para as cidades. Trata-se de reinterpretar, revisitar a arquitetura com a finalidade de possibilitar uma nova e distinta visão dela mesma a partir de uma visão outra.

Você procura um arquiteto, fala sobre suas expectativas e sentimentos, e o arquiteto é responsável por traduzir isto em arquitetura, em espaço construído. E porque? Porque se trata de indivíduos, de sentir-se bem, de um espaço para viver, um espaço identificável como seu, pois quando nos identificamos com algo, significa que, as suas referencias previas condizem com aquela realidade que está sendo assimilada. 

Ainda, deve-se levar em conta que qualquer arquitetura faz parte de uma cidade, e ela deve se relacionar com esta cidade, com seu entorno imediato e com seu entorno global. Imagine um ser humano que não se relaciona com os demais, ou pior, que se relaciona de forma agressiva, invasiva, grosseira ou violenta com os outros. É quase isso. A arquitetura deve ser sincera com o lugar. Deve ser justa com o tempo, deve ser verdadeira. Deve acrescentar algo a cidade e deve participar do processo de produção e construção dela. Na vida, devemos procurar acrescentar algo as pessoas e as coisas, devemos produzir algo que possa colaborar com alguma coisa. Precisamos evoluir. Assim como a arquitetura deve colaborar com a experiência tectônica e estética do mundo e proporcionar um ponto de vista distinto sobre a cidade ou sobre os indivíduos que a habitam (ou que simplesmente a observam). Um indivíduo deve participar da sociedade, produzir algo que colabore, que venha a somar, ou viemos a vida simplesmente para assisti-la passar assim como passará essa “pseudo-arquitetura de papelão”? 

Este texto é uma interpretação particular de assuntos discutidos no livro de Kate Nesbitt, “Uma nova agenda para a arquitetura, antologia teórica 1965-1995. São Paulo, Cosac Naify, 2006. Também compreende assimilações do ensaio “La ressonância temporal e la arquitectura” de Tony Díaz publicado pela revista Summa+ n.97, Noviembre de 2008.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Eu amo futebol.


Por Vinicius Libardoni
Não tô nem ai para o vão dizer. Mais eu amo futebol. Inexplicavelmente, sou um ser humano, primitivo, irracional e ainda torço por um time da segunda divisão. Merda, falei!
Cada um escolhe o seu passatempo. O meu, passa na tevê as quartas-feiras depois da novela e no domingo antes do faustão. Sorte a minha que, meu passatempo não é nem novela, nem faustão.  Não vou aqui defender a minha lógica, mais não poderia perder a oportunidade, já que tocamos no assunto, para discorrer uma pequena crítica.
Desde que os circos romanos foram transformados em santuários e museus, o homem precisou criar outros tipos de espetáculos para suportar a sua terrível superficialidade. O futebol pode ser considerado uma maneira, através da qual, existe a possibilidade de sentir-se vitorioso por alguns momentos em uma sociedade que não admite perdedores.
Prefiro o futebol à loteria, as vezes se ganha, as vezes se perde, mais não se vive na esperança que a probabilidade um dia, transformará sua vida. A maioria das pessoas vive esperando algo ou alguma coisa, não tem a menor capacidade de tomar a iniciativa para quase nada. Eu, pelo menos, tomo a iniciativa de comprar a cerveja gelada duas vezes por semana. Posso viver como um ser humano normal, quase o tempo todo, exceto quando rola a bola por noventa minutos. 

terça-feira, 4 de outubro de 2011

O (des)controle do tempo


Por Vinicius Libardoni
E eu sigo ouvindo as pessoas exclamarem com veemência que o tempo passa rápido demais. Um dia desses, quando minha colega de trabalho disse: “Caramba, já nos aproximamos do final do ano!”, me permiti construir um pensamento que descrevo mais ou menos desta maneira:

Seria o sentimento de descontrole, do decurso do tempo, certa ausência de memórias significativas?  Acredito que essa foi a minha grande conclusão aquele dia. Tentarei explicar, algo que, na verdade, pelo menos pra mim, não tem explicação alguma.

Em curto prazo, o tempo sempre parece passar apressadamente, principalmente para aqueles que têm o tempo bastante ocupado, ou, na verdade, ocupam razoavelmente o seu tempo com afazeres variados. A repetição de tais afazeres é o que poderíamos chamar de “rotina”. Normalmente a rotina é tida como algo desinteressante e desanimador. A verdade é que a rotina pode não ser chata, desde que, ela possa ser incrementada por novas atividades cotidianamente, como ler um romance, ver um bom filme, conhecer outro lugar, fazer uma nova amizade, pelo menos, semanalmente.

Isto porque, a meu ver, em longo prazo, são as memórias que determinam a duração e a consistência do tempo passado. A rotina é certo tipo de “contra-memória” enquanto os novos conhecimentos são algo como “favor-memória”.

Quando, em curto prazo, se vive na rotina, pode-se, mesmo que lhe custe trabalho, lembrar vagamente dos acontecimentos da semana passada. Mais é quase impossível depois de um mês, denunciar os fatos verídicos referentes a cada semana. Mais difícil ainda é localizar, ao final de um ano, os acontecimentos referentes a cada mês. Ou você não foi surpreendido com o anúncio de que já faz um ano daquele fato surpreendente?

Ninguém pode deter a passagem do tempo. Entretanto, pode-se produzir memória através do transcurso do tempo. Devemos deixar de reclamar de não ter tempo pra nada, que queremos mais horas diárias ou dias incrementando os finais de semana. É preciso habituar-se a construir memórias, e com isso, dar consistência ao tempo que se vive e não deixa-lo passar inconsistentemente.

Por que uma viagem de um mês a outro país são lembranças que equivalem a um ano inteiro da sua vida rotineira? Porque estão cheias de memórias construídas, de relações, de conhecimento, de imagens mentais. Não se precisam viajar milhares de quilômetros para construir memória. É preciso iniciativa e força de vontade.

Reclamar não vai mudar as coisas, e se continuares a fazer as mesmas coisas esperando resultados diferentes, isso é, no mínimo, burrice. Lamentavelmente, a banalidade das informações que recebemos diariamente, não passam de memórias de hiper-curto prazo e precisam ser alimentadas mais e mais frequentemente. Depois de um ano gasto se atualizando no que as pessoas curtiram ou deixaram de curtir na rede, nada fica, não há minimamente, memória construída.

A questão então me parece, menos em relação ao decurso do tempo (o que não te concerne), e mais a o que estas a fazer com o seu tempo (o que deveria te concernir). 

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Elogio da loucura - Erasmo de Roterdam

Por Vinicius Libardoni



Custaram-me cinco reais em um sebo perdido ao final de uma galeria escura. Tão perdido quanto os meus propósitos aquela manhã, estava este livro em meio a outros exemplares que mais pareciam desiludir esta pobre e velha edição de que alguém, um dia, iria recolhê-la. Quem sabe quantos anos se passaram e ela estava ali, da prateleira de livros velhos, para a prateleira de livros em promoção para enfim, a aquela prateleira dos livros sem destino. O último passo antes de ser olvidado fora do alcance de olhos curiosos, até que as traças o obriguem a virar vazio e não mais conteúdo.
Mais ele deu sorte aquele dia, e minha memória, ainda mais. Um breve comentário que li em um livro de Jorge Luis Borges apareceram de maneira fugaz em minha lembrança. Com certeza estive procurando por um bom tempo sem muito sucesso, mais encontrar este exemplar perdido de capa pictórica produzida por estúdios P.E.A,  saltou aos meus olhos. Paguei apenas cinco reais. Era o preço mínimo daquele Sebo. Com toda a certeza, a vendedora poderia jurar que mesmo sem preço algum, alguém desejaria leva-lo dali. Eu quis. Realizei tal façanha com um sorriso enorme no rosto e uma paz imensa na alma. Pensei: “linda a vida de quem trabalha em um sebo”. É quase que um serviço de assistência social, onde se procura os pais de crianças perdidas em feiras, exposições ou até, daqueles que ficam perdidos nas grandes cidades sem nunca haver conhecido sua procedência natural. Senti como se tivesse encontrado algo que tivesse perdido a muito tempo.
Uma linda publicação de páginas secas e amareladas, com um perfume de livro velho que cheira a sabedoria. Uma publicação da Europa-América que, publicou entre outros volumes daquela coleção de bolso, O monte dos ventos uivantes, Bel-Ami, As mãos sujas, A religiosa, Noites brancas e o Albergue Nocturno. Pequeninho ali no canto vejo: Edição nº40 561/1821. Execução gráfica: oficinas de P.E.A. (Julho de 1973). Desta edição, os repasso as seguintes informações:
                “Erasmo foi um dos maiores eruditos da época do Renascimento e da Reforma. Espírito crítico, cosmopolita e ecuménico, advogou a liberdade de consciência e de expressão tanto na esfera civil como eclesiástica. Imortalizou-se com o Elogio da Loucura, uma obra em que o autor, domina todos os recursos da ironia, mas onde, sob o sorriso que irreversivelmente nos faz aflorar aos lábios, se evidencia o protesto moral consciente ou inconscientemente, protagonizamos. Elogio da Loucura transcende o tempo. Para reconhecer a permanente actualidade, basta aplicar a crítica de Erasmo à sociedade contemporânea. O que não será difícil ao leitor”.
A bela surpresa que encontro, um pequeno selo descolado da primeira página e perdido entre as outras, “Livraria Camões, Rua Bittencourt da Silva, 12-C, Rio de Janeiro”, quem sabe, foi lá que seu primeiro dono encontrou estelivro de Erasmo, quem saberá porque, tal criatura, se desfez do mesmo. Exatamente  naquela página pude ler esta passagem:
“Deixemos de lado os sábios, que acusam de insanidade e impertinência aquele que se louva a si próprio. Se isto é loucura, assenta-me às mil maravilhas. Nada há de mais natural para a Loucura que soprar na trombeta da glória e entoar, em pessoa, os seus próprios louvores. Quem me descreveria com mais verdade, se ninguém me conhece melhor que eu mesmo me conheço?”

Mais do que isso, só a sugestão.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

cidades imaginárias

Por Vinicius Libardoni

Extra, extra! A maior desgraça às cidades brasileiras está com data marcada!
Embora neste país exista sempre um enorme vazio entre a teoria e a prática, desta fez, (in)felizmente, largamos muito na frente. Estamos correndo disparados em direção a uma grande tragédia: a Copa do Mundo de 2014 e o ‘Rio 2016’. Espero, ansiosamente, descobrir que estive equivocado, porém, é assim que percebo a situação atualmente.
A questão é simples, existem duas expectativas muito distintas: aquela dos cidadãos brasileiros, e a dos milhões de turistas que deverão visitar o país nos próximos anos. Equivocadamente, priorizam-se cidades imaginárias, as quais os turistas sonham encontrar, ou, talvez, aquelas que desejamos projetar para agradá-los. Tudo em favor de um turismo acidental, ou a tentativa falha de vender uma imagem quase que pitoresca, de um país maravilhoso. Maravilhoso? Até quando vamos encontrar na paisagem a doce ilusão de estar vivemos em um lugar maravilhoso? Estamos tão distantes de um país maravilhoso quanto esta cidade imaginária do turista está da real situação urbana e social deste país.
Seria, por acaso, um desejo absurdo sonhar com cidades imaginadas, ou seja, aquelas feitas para as pessoas que nelas vivem? Parece-me que, a cidade que é boa para a população que a habita, é também uma cidade agradável aos forasteiros. Entretanto, aquela cidade “imagem” que tanto pode ser proveitosa para um turista, nem sempre, e quase nunca, é aprazível ao ser que nela vive cotidianamente.
Isso deveria ser visto como uma grande oportunidade de crescimento social e produção de um espaço urbano justo para com seus cidadãos. Foi o que Barcelona fez quando dos jogos olímpicos de 1992. La onde Gaudí, desenvolveu sua arquitetura nacionalista disparatada, foi onde coincidiram as expectativas dos turistas e as necessidades dos cidadãos. O êxito foi indiscutível, talvez o maior exemplo deste tipo de evento global. Uma justificativa para transformar a ordem urbana. Porém, no país da arquitetura mambembe, nossas experiências prévias tem sido desastrosas. Nossa enorme capacidade de deixar tudo pra depois integrada com a essência podre dos governantes, tudo aponta para uma exótica promoção de um país de faz de conta. O PAN Americano de 2007 foi calamitosa. Parece que não houve nenhum aprendizado. Como benefício para a cidade ficou um estádio que antes de pronto já precisava ser reformado, e a cidade olímpica, que ao que me consta, são dezenas de apartamentos mal projetados que se encontram vazios, sem nenhum tipo de uso. Da pra recorrer da escolha com a FIFA e com a COI? Não? Então devo desejar boa sorte! Espero que seja suficiente!

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Devaneios a partir da pertinência da arquitetura clássica de Demetri Porphyrios

Por Vinicius Libardoni

Falando em pertinência, inicio este monólogo perguntando-me a respeito da impertinência da “pseudo-arquitetura de papelão”. Somos educados como modernistas, embora a discussão acerca da arquitetura moderna já tenha se esgotado, pelo menos, na minha paciência.
Deste modo, “habituamo-nos a pensar que nossa contribuição está contida exclusivamente no que é diferente. Por isso, geralmente nos inclinamos a valorizar questões estilísticas de menor importância”. Se a verdadeira contribuição do arquiteto está no que se escolhe como referência, quem irá nos ensinar que tomar algo emprestado está tão distante de incorporar, de maneira pictórica (se não como paródia ou anacronismo deliberado), pequenas partes daquelas questões estilísticas de menor importância?
É preciso entender a arquitetura a partir de uma consciência construtiva. Então, porque discutir a pertinência da arquitetura moderna se aqueles edifícios são sim, arquitetura. E se a contribuição está nas referências que se tomam para si, há de perceber que existe razão direta com o feito realizado pela obra, qual, nos apropriamos. E parece-me evidente que, as boas referências, persistem as mesmas.
O grande desastre, por assim dizer, sinceramente, está nesta escola medíocre que frequentamos sem escola, ou melhor, sem escolha. Há a doce ilusão de formar gênios. Na verdade, formamos milhares de profissionais medíocres. Se a ética mercantil baseia-se na pretensão de que toda obra de arte é uma invenção singular, e que buscamos em um resíduo de originalidade a prova de talento, neste caso, poderia dizer: a arquitetura é muito mais uma profissão que arte.
“A arquitetura não tem nada que ver com a “mania de novidade” ou com sofismas intelectuais. A arquitetura não tem relação alguma com a transgressão, o enfado ou a paródia. A arquitetura tem que ver com decisões a respeito do que é bom, decente, correto. É menos um dom que uma tarefa permanente de ajustamento às contingências do presente”.
São só aplausos para um bom texto, que incita em nós, o desejo de transformar a dura realidade.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

a tentativa de construir uma discussão

Por Vinicius Libardoni

Mais do que textos dispersos, devaneios sobre qualquer coisa, isto representa uma tentativa de construir uma discussão. Ainda que sutilmente localizada sobre o âmbito da disciplina da arquitetura, há um intento claro de atravessamentos a partir de outras disciplinas de maneira a contribuir com a diversificação do debate.
Gregorio Marañón, médico endocrinologista, cientista, historiador, escritor e pensador espanhol, disse: “Aquele que somente se interessa por sua especialidade, nem ela mesma lhe interessa”. Ou seja, segundo este madrileño nascido em 19 de maio de 1887, devemos buscar conhecer um pouco de todas as áreas, pois, conforme diria o pessimista, não nos tornaremos sábios em quase nada e sim, ignorantes em quase tudo.
Concordo plenamente com Tschumi quando discorre em notas para uma teoria da disjunção arquitetônica[1], a respeito das estratégias de disjunção. O autor nos revela que tal estratégia não deve ser considerada um conceito arquitetônico, mais uma maneira através da qual, é possível entender a própria atividade de produção de conhecimento em arquitetura. Não se trata de ideias abstratas acerca de teorias sem pé nem cabeça ou, projetos sem começo nem fim. Incorporar outras disciplinas e atividades em nosso processo projetual não é, de modo algum, uma justificativa ou uma fuga da arquitetura mesma. Deve ser encarada como uma procura por uma arquitetura outra, que incorpore toda a complexidade do fenômeno arquitetônico e suas pluralidades. Parafraseando Tschumi “...o progresso da notação arquitetônica está ligado a uma renovação da arquitetura e dos conceitos de cultura que a acompanham”.

A busca por incorporar outros profissionais, que não aqueles tradicionais, atividades, olhares, pensamentos, teorias, exigências, usuários, na atividade de projeto de arquitetura, não devem ser conduzidos abstratamente pois, é um trabalho que se desenvolve no âmbito da disciplina da arquitetura, ainda que consciente de outros campos. É quase que um deslocamento, uma permeabilidade através de outras variáveis consideradas sobre a produção da arquitetura. Somente através de um posicionamento como tal, poderemos compreender a arquitetura como uma atividade humana altamente complexa como ela realmente deve ser compreendida.
Volto a afirmar na importância de diversificar a procura por conhecimento no momento que, quanto mais respiro tão apaixonante ofício, mais sinto a necessidade de estudar outras coisas, independentes da arquitetura. Independentes até certo ponto, pois, aquele que realmente está preocupado em construir e produzir conhecimento através do ofício conseguirá enxergar arquitetura em tudo o que observa.
Percebo também que, o aprendizado nunca é imediato. Nesta procura por entender o mundo e as coisas que com ele se relacionam, vivo uma busca incessante por conhecimento e aprendizado. Ontem era ainda uma pequena criança inapta para absorver temas de maior complexidade. Acho que, devemos viver com esta doce ilusão permanentemente, que ontem erámos incapazes de compreender certas coisas, hoje se é dedicados o suficiente para tentar absorver os temas que não entendíamos ontem e, finalmente, desejo, amanhã, ser sábio a respeito de tudo que um dia discutíamos.  


[1] Introdução: notas para uma teoría da disjunção arquitetônica. TSCHUMI, Bernard. Do livro, Uma nova agenda para  arquitetura, NESBITT, Kate. São Paulo, Cosac Naify, 2006.